Porque não uso estabilizador
Faz muito tempo que o estabilizador não faz parte da minha lista de equipamentos de proteção. A maioria dos clientes e amigos que me procuram na hora de instalar um PC estranha quando recomendo remover este dispositivo da instalação, ainda mais quando dou como justificativa o fato dele “estragar” o PC.
“- Como pode esse Luferat navegar contra a maré?”
Enquanto 99,9 % dos técnicos quase obrigam o cliente a instalar o bendito sistema "gerador de estalinhos" eu quase repudio o uso da coisa, mas é pelo simples fato de entender seu funcionamento na prática. Sem entrar em pormenores técnicos ou em áreas obscuras da eletroeletrônica, vou tentar explicar " meu ponto de vista...
O que é um estabilizador?
Basicamente o que o estabilizador faz é manter sua saída, onde ligamos o equipamento “protegido”, sempre dentro de uma faixa tolerável de tensões, independente do que está na entrada que é a tomada que vai na rede elétrica.
Como exemplo, pense em um estabilizador linear genérico, com uma especificação de saída entre 110 e 120 volts (115 volts "nominais"). Se a tensão da rede elétrica estiver dentro desta faixa, o estabilizador nada fará, ele não atuará na saída mesmo que haja variações na tensão dentro desta faixa. Caso a rede "caia" abaixo de 110 volts o estabilizador detecta e provê mais tensão para a saída, algo em torno de 10% a mais, de forma a mantê-la dentro da faixa nominal.
Do contrário, caso a rede "suba" demais, ultrapassando os 125 volts, o estabilizador entra em ação novamente, só que agora ele vai remover algo em torno de 10% da tensão da saída, mais uma vez para “encaixar” está na faixa estabelecida.
Sem mágicas, tá? Claro que se a rede cair para algo abaixo de 100 volts, o estabilizador para de funcionar. No outro extremo, tensões acima de 140 volts podem danificar o aparelho ou no mínimo acionar o sistema de proteção, normalmente composto de um fusível e um varistor.
A maioria dos estabilizadores populares "estala" justamente nestes momentos em que eles estão tentando aumentar ou reduzir a tensão da saída. Quem faz esses “estalos” são relés eletromecânicos, e justamente nestes componentes reside o maior problema dos estabilizadores. Veremos isso abaixo...
Um relê eletromecânico.
E a fonte do PC?
Sem dúvidas a fonte é o componente mais importante e incompreendido do PC. Importante porque sem energia o PC simplesmente não existiria e incompreendida porque poucos prestam atenção nela! O fato é que, na prática, processar, dados, programas, bits e bytes nada mais são do que eletricidade. Quanto melhor a "qualidade" desta eletricidade, mais rápido e estável o sistema será.
A maioria esmagadora das fontes para PC são do tipo “chaveada” ao contrário dos estabilizadores que são "lineares". Este tipo de fonte opera em frequências muito mais altas do que os 60 Hz da nossa rede elétrica. Basicamente o que temos dentro dela, é um oscilador que transforma as 60 oscilações por segundo da rede elétrica em algo por volta das 15.000 oscilações por segundo, dependendo do modelo. A característica “chaveada” vem do fato de que, quem faz o trabalho pesado dessa conversão é um transistor que fica ligando e desligando, como um interruptor ou uma "chave", milhares de vezes por segundo.
Dentre as vantagens em se operar com velocidades de chaveamento tão altas temos:
- Tamanho e peso reduzido
- Correntes muito altas
- Maior relação custo x corrente
- Melhor aproveitamento da energia
- Mais estabilidade
- Maior imunidade a interferências e variações oriundas da rede elétrica
Mas, é daí?
O fato de operar com frequências altas, permite que a fonte chaveada faça correções muito mais eficientes e dinâmicas do que qualquer estabilizador, mantendo as tensões de saída, que alimentam diretamente os componentes do PC, muito mais estáveis.
Analogamente ao estabilizador, só que agora levando-se em conta a tensão de 5 volts da saída da fonte, se a rede elétrica "subir" demais vai criar uma variação de alguns milivolts, ou seja, de menos de 1 volt nesta linha de 5 volts. Esta variação é detectada pelos circuitos da fonte que reduzirão imediatamente o ritmo do chaveamento, fazendo a tensão retornar aos 5 volts rapidamente. Este tempo entre detectar e corrigir o problema leva algo em torno de 0,00001 segundo.
O contrário também funciona: caso a tensão da rede caia, diminuindo a tensão de saída da fonte, de imediato os circuitos internos farão a correção, aumentando as oscilações, de forma a mandar mais energia para a saída, mantendo os 5 volts dentro de uma faixa muito estreita.
A necessidade do estabilizador já pode ser contestada aí, se a fonte do PC já faz o trabalho de regulação da saída de acordo com as variações da entrada, o estabilizador perde sua funcionalidade. Antes que comentem, as fontes dos monitores são tão ou até mais eficientes que a do PC, e não caberia o uso do estabilizador para este componente também.
Aí você diria: “ – O estabilizador não seria mais um sistema de proteção então?” Ou seja, será que a proteção do estabilizador não se somaria à proteção oferecida pela fonte?
Pensemos bem: a maioria dos estabilizadores opera com componentes eletro-mecânicos, os relês que são chaves mecânicas, ou seja, tem um tempo de chaveamento muito longo, algo em torno de 0,03 segundo, além de gerar uma quantidade enorme de ruídos e faíscas durante o chaveamento. Existem modelos eletrônicos, que usam "tiristores" no lugar dos relês, eles geram menos ruído, mas mesmo assim esses componentes atuam na rede elétrica e estão limitados aos 60 ciclos ou 60 correções por segundo.
O estabilizador só atua dentro de faixas de tensão. Se a rede variar entre 110 e 120, por exemplo, o estabilizador não fará nada por considerar que estas variações estão dentro da faixa nominal e acaba deixando o trabalho para a fonte do PC de qualquer forma...
Já a fonte chaveada, que opera com milhares de oscilações por segundo, pode corrigir as tensões na mesma proporção, e com a precisão de menos de 1 volt na saída.
Na prática, o que significa?
Especulando... Toda vez que há uma variação na rede elétrica, a fonte do PC se esforça para corrigi-la na casa de 10-5 segundo que é um chute alto. Muitos milissegundos depois, uma eternidade em termos de processamento, o estabilizador “detecta” essa variação e modifica sua saída, enviando para ela todos os ruídos e interferências oriundas da correção. Neste momento, a fonte do PC é obrigada a refazer as correções que aconteceram anteriormente, mais uma vez esforçando-se para se ajustar à tensão da rede que agora foi modificada pelo estabilizador.
Em resumo, toda vez que há uma variação da rede elétrica em que o estabilizador atua uma única vez, a fonte tem que atuar várias vezes neste mesmo instante, tanto para corrigir as variações da rede quanto as que são entregues à ela pelo estabilizador.
Isso nos leva a crer que com o uso de um estabilizador, o que estamos fazendo é forçando a fonte a trabalhar muito mais do que se ele, o estabilizador, não existisse. E o trabalho não é de graça: teremos em contrapartida um maior consumo de energia, uma diminuição na eficiência da fonte com maior variação na sua saída e, com certeza uma diminuição drástica na vida útil do componente mais importante do PC.
Em tempos passados o estabilizador tinha sua utilidade. Na época em que a maioria dos equipamentos era importado via "contrabando" e em que o mundo não era tão globalizado, as fontes dos primeiros PCs não estavam preparadas para operar em nossa rede elétrica tropical, enferrujada, ultrapassada, cheia de ruídos, gatos e marimbondos.
Mas hoje os tempos são outros, o mercado se internacionalizou e mesmo os fabricantes "ching ling" de segunda linha tem interesse em vender suas bugigangas para agente e acabam adaptando seus produtos para operar aqui.
Em contrapartida nossa rede elétrica evoluiu muito e prova disso é que em breve alguns poderão até mesmo acessar a Internet por ela! Será?
E os outros sistemas de proteção?
Veja bem, posso condenar o uso do estabilizador, mas outros sistemas como o nobreak, ou filtro de linha "verdadeiro" e principalmente o aterramento se tornam indispensáveis, ainda mais com a ausência do "tal" estabilizador.
A substituição de um estabilizador vagabundo por um filtro de linha de qualidade é altamente recomendada. Infelizmente não é fácil encontrar um filtro de linha que preste. Eu mesmo, até um tempo atrás, preferia montar os meus.
Já o nobreak tem outra função: ele provê energia para o PC mesmo que a rede elétrica falhe. Isso contribui não só para a nossa produtividade como para preservar a fonte e os componentes do PC dos "sustos" que a falta e o retorno da energia elétrica imporiam a eles. Mas cuidado com os nobreaks que estão no mercado. Pesquise por marcas de qualidade e lembre-se que, no caso do PC, o "barato" normalmente será bem caro no futuro próximo...
Aterramento? Nada a comentar aqui... Leia este artigo para se tocar da real necessidade deste sistema de proteção.
Aterramento elétrico.
Conclusão
Se prestarmos atenção no mundo, vamos ver que poucos países além do Brasil adotam o estabilizador de voltagem como componente fundamental do PC. Nós criamos uma cultura ao redor deste componente que poucos sabem para que serve realmente e apenas alguns fabricantes e varejistas ganham uma boa grana com a desinformação do povo.
Eu não uso faz tempo. Em meus PCs só rola nobreak ou então um filtro de linha com régua de tomadas.